
(Imagem: Divulgação/Versátil Home Video)
Um dos tópicos mais discutidos dentro da indústria é a representação negra nos filmes. Sabemos como é escassa, trazendo poucas oportunidades e, em sua maioria, já destinada para certos personagens específicos. Ao receber o primeiro prêmio do Emmy direcionado a uma mulher negra na categoria de Melhor Atriz, Viola Davis disse: “Você não pode ganhar um Emmy por papéis que simplesmente não existem” e assim como ela disse, essa é a única coisa que separa a comunidade negra de qualquer outra pessoa, a oportunidade.
Em tempos de premiações, essa discussão aumenta, sendo necessária ainda no século 21, porque em pleno 2022, muita coisa não mudou – por mais que tenha avanços significativos. O Oscar acontece no próximo domingo e, por mais que a preferida para levar o Oscar de Melhor Atriz Coadjuvante seja negra e descendente de porto-riquenho, no prêmio principal feminino, a última e única vez que ocorreu foi há 20 anos, com a Halle Berry levando o prêmio pelo filme A Última Ceia.

(Imagem: Divulgação/Universal Studios)
Para se ter um pouco de noção, em 94 edições do prêmio, apenas duas mulheres levaram o prêmio de Melhor Direção (possivelmente a terceira esse ano #dedoscruzados), apenas em 2018 que um roteirista afro-americano levou o prêmio de Melhor Roteiro Original, com o Jordan Peele fazendo história na premiação ao ser laureado pela obra-prima Corra! de 2017, um filme de terror, gênero esse que dificilmente tem espaço na premiação.
Ao observar esse cenário dentro do contexto do cinema de horror temos uma discussão ainda mais abrangente, que pode ser vista inclusive no documentário Horror Noire: A História do Horror Negro, de 2019, disponível no streaming Darkflix. Além de ser documentário, a obra também é um livro que foi lançado no Brasil pela editora Darkside. Trazendo uma visão desde os primórdios do audiovisual sobre a colocação da comunidade negra nos projetos hollywoodianos, o filme traz idealizadores e personagens na história do cinema que contribuíram no crescimento e no ato de se falar sobre a comunidade negra.
Traz uma abordagem didática ao analisar o clássico e extremamente racista obra de D.W. Griffith, O Nascimento de uma Nação, de 1915, primeiro filme exibido na Casa Branca e recebendo o apoio do então presidente Woodrow Wilson. A obra serviu para reacender o Ku Klux Klan, tendo apoio do líder da nação estadunidense. Desde então, as representações da comunidade negra se tornaram estereotipadas, associando sempre à violência, fazendo o branco como o salvador e o homem preto como vilão.
Ao trazer para a indústria do terror, os personagens negros passaram anos sendo associados a monstros. Isso teria uma leve mudança quando ao final da década de 60, precisamente em 1968, tivemos um protagonista negro em A Noite dos Mortos Vivos, de George A. Romero. Com uma trama que critica a sociedade de forma indireta, mostrando uma sociedade doente, Duane Jones representou Ben, o protagonista e líder que leva um fim que refletia o que vinha acontecendo de forma brutal com a comunidade negra naquela década. O que assusta é que mais de 50 anos depois pouca coisa mudou e o filme continua bem atual.
Com a chegada da década de 70, o blaxploitation chegou com tudo. Com produções de baixo orçamento, os filmes eram protagonizados e realizado por atores e diretores negros, que tinha como alvo o público negro. O termo blaxploitation é uma aglutinação formado por blax (negro) e explotaition (exploração), que para alguns é isso que os filmes desse gênero significam. Os estereótipos trazidos incluem personagens envolvidos com tráficos, prostituição e a brutalidade. Uma dos maiores representações dessa era foi o filme Blácula, uma versão do Drácula, só que protagonizado por um elenco majoritariamente negro. Abby, um filme inspirado nos clássicos O Bebê de Rosemary de 1968 e O Exorcista de 1973, dirigido por William Girdler, traz a nossa protagonista interpretada pela atriz Carol Speede, que faleceu esse ano, uma mulher que é possuída por um demônio do sexo. O filme não envelheceu muito bem, mas tem alguns pontos interessantes, como a repressão sexual da Abby. Ambos os filmes tem o ator William H. Marshall no elenco.
Outro filme bastante importante desse movimento, e bastante esquecido, se chama Ganja & Hess, de 1973. Um filme experimental dirigido por Bill Gunn e estrelado por Marlene Clark e Duane Jones, o longa trata sobre o Dr. Hess Green (Duane Jones), que se transforma em vampiro após seu assistente (interpretado pelo Gunn) o apunhalar com uma adaga ancestral amaldiçoada. Após esse acontecimento, Green se apaixona pela sua assistente, Ganja (Marlene Clark). O filme foi aclamado em Cannes, mas quando chegou nos Estados Unidos foi rejeitado. Os produtores venderam o filme para outra companhia, que mudou o título para Blood Couple e o picotaram todo. A versão original foi doada para o Museu de Arte Moderna, em Nova York, sendo restaurado com o apoio da The Film Foundantion.
Nos anos 80 tivemos a saída do sítio urbano, indo para os subúrbios. Os monstros tiveram que se adaptar, indo em contraste com os lemas do governo do presidente Ronald Reagan e seu slogan “Let’s Make America Great Again” – lembra o de outro presidente, não é mesmo? Sua presidência usou de tudo para colocar os negros como a cara do que precisava ser exterminado, além de uma politica tradicionalista. Assim, com todo o crescimento da moralidade, nascia assim Michael Myers, Jason e Freddy Krueger, e os assassinos do “fez sexo, morreu”. Dentro desse universo, os personagens direcionados aos atores negros se resumiam aos sidekicks ou as primeiras vitimas. Nunca final girls, quase nunca os últimos a chegar ao final.
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(Imagem: Divulgação/PolyGram Filmed Entertainment) |
Na década de 90, tivemos um dos personagens mais icônicos da cultura negra, Candyman. Em 1992, Tony Todd daria a vida a esse personagem e marcaria sua filmografia. Com outras duas continuações pouco faladas e até com pouco brilho, o primeiro filme é considerado um dos mais marcantes. Com algumas problemáticas, trazendo uma dinâmica repetitiva do homem negro obcecado pela mulher branca, um clichê criado lá no inicio do século 20. Clichês esses que são muito utilizados até hoje. Não só esse, como também do negro místico, do alivio cômico, e quando eu assisti ao documentário, percebi e descobri o personagem negro que serve como sacrifício para sobrevivência do personagem branco. São várias as problemáticas nas representações que se estendem até hoje.
Ao chegar na atualidade, temos maiores representações e diretores ganhando mais destaques. Jordan Peele é um dos maiores nomes atuais do cinema e do terror, trazendo obras específicas além de Corra!, como Nós, e além disso, produzindo obras incríveis. O remake de Candyman trouxe na produção o Peele e a direção de Nia da Costa, fazendo algumas correções diante da proposta da criatura. Remi Weeks trouxe em 2020 a grande obra O Que Ficou Para Trás, disponível na Netflix, um filme sensível e intenso, saindo dos clichês já vistos em outrora.
O cinema é algo que precisa ser discutido, pois cultura é algo impregnado nas nossas vidas. A discussão diante o racismo tem que ser todos os dias, não só quando estamos chegando perto de premiações e percebemos a ausência de nomes que sabemos que deveriam estar ali. Temos que consumir, discutir e tentar trazer para superfície para outras pessoas descobrirem esses nomes.
O documentário está disponível na Darkflix, streaming direcionado ao cinema de terror. Com um valor de R$9,90 mensais, o catálogo é formado por documentários, séries e vários filmes de terror. O livro pode ser encontrado nas melhoras lojas e no site da Darkside.
(Foto: Adan Cavalcante) Onde assistir? Darkflix Onde comprar? Amazon ou Darkside Quantas paginas? 464 paginas Qual o valor? A partir de 40,00 |
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