
(Foto: Reprodução/Disney)
Quando eu era pequena, ali pelos 6 ou 7 anos, a minha princesa favorita era a Ariel. Eu amava a ideia dela ser uma sereia, os cabelos ruivos e eu também tinha um crush no Eric. Tirando o lado mítico da coisa, ela ainda assim era muito diferente de mim, porque a Ariel era branca e eu uma criança negra. Eu não tinha essa percepção na época, da falta de identificação em relação aos traços físicos e cor da pele, mas eu sabia que ela era diferente de mim para muito além da cauda de peixe.
E não era só a Ariel.
Nessa época, ali no início dos anos 2000, não haviam princesas pretas. A Pocahontas era o mais perto do tom da minha pele que havia, mas, ainda assim, ela não era negra e também não possuía aquele ideal de princesa que a maioria das meninas gostava de ver e queria se identificar. Eu também gostava da Jasmine, em Aladdin, sempre gostei, pelos cabelos volumosos, a pele não-branca, mas, assim como a Pocahontas, ela não era negra. Eu tive que aprender a me encontrar em outras características e foi quando me apeguei a Belle, de A Bela e a Fera. Ela gostava de ler, eu também. Isso parecia ser suficiente ou, pelo menos, tinha que ser.
A primeira princesa negra chegou em 2009, a Tiana em A Princesa e o Sapo. Lembro do quanto isso foi importante, do quanto isso chamou atenção. Ela com seu cabelo meio cacheado, com aquela textura 2d ainda, mas valeu demais a tentativa, ainda vale. Outras crianças, diferentemente de mim, da minha prima, cresceram com essa referência. Em 2016, com a Moana, a princesa da Polinésia, eu pude me enxergar ainda mais com o corpo fora do ideal magro das princesas anteriores, o cabelo cacheado com texturas e volumes e mesmo não sendo negra, sua pele parda gera conexão.
Mas, em 2019 saiu a notícia de que Halle Bailey, que eu conhecia de Grown-Ish, faria a Ariel no live-action da Disney para A Pequena Sereia. O abraço naquela Bea de seis anos foi automático e inevitável. O primeiro trailer saiu esse fim de semana, foi emocionante poder me enxergar em traços da minha princesa favorita. Entenda, mesmo com todas as anteriores que eu já mencionei e a importância de cada uma delas, a Ariel da Halle é um presente para a Bea do passado que, finalmente, consegue se ver em uma produção que foi tão especial.
A minha festa de seis anos – ou sete, nunca lembro – teve o tema de A Pequena Sereia. Eu tinha uma pelúcia do “Linguado” e sempre que era liberada para ir na locadora, eu procurava pela capa com aquela sereia ruiva de cauda verde. Faz parte das minhas memórias e da minha história. Então, ressalto novamente, imagine quão emocionante não foi poder se perceber ali.
E desde que o trailer saiu, a Halle tem sido atacada. Uma série de pessoas que, com toda certeza, deveriam possuir outras preocupações, estão questionando a escolha da atriz por conta da cor da pele. “Ah, mas a Ariel de verdade é branca”, alguém conta para eles que sereias não existem? Pelo amor!
O bom é que para cada comentário racista ou dislike no vídeo oficial do trailer existe uma menininha preta brilhando os olhos para a tela se enxergando ali. Tem uma menininha preta vibrando que “ela é preta” ou que “a pele dela é marrom”, como vimos no vídeo que viralizou contrapondo esse racismo desenfreado. Assim como eu “voltei no tempo” para dizer a Bea do passado que a Ariel agora era preta, centenas e milhares de crianças negras poderão ir aos cinemas ou assistir no streaming a sua princesa favorita parecida consigo mesmo.

Tudo isso reitera algo que eu já falei aqui várias e várias vezes sobre representatividade e o quanto ela importa. É como a cantora Lizzo no Emmy deste ano, que aconteceu ontem, dizendo que quando era criança não via referências pretas e gordas como ela na TV e hoje ela cresceu e pode ser essa referência para as crianças atuais, para que elas não cresçam com a mesma visão distorcida de si mesmo ou com a falta de régua social para se sentirem confiantes, seguras e empoderadas o suficiente para não ceder ao racismo, à gordofobia, etc.
Só questiona a representatividade quem nunca deixou de se enxergar nos lugares, ou quem tem o desejo de permanecer na ignorância e não abrir os olhos para a realidade. Fiquei feliz em saber que o vídeo que mencionei ali em cima, das menininhas assistindo ao trailer, tenha chegado na Halle, porque imagino que ela passou a vida inteira sendo questionada e a enxurrada de críticas e descurtidas nas redes pode parecer pouco, mas causam impacto em quem está por trás recebendo-as. E fico mais feliz ainda por saber que a Halle sabe não só da responsabilidade, mas da importância que tem isso que ela está fazendo!
Que a gente tenha mais princesas pretas, originais ou releituras. Que a gente tenha mais Halles e mais Lizzos abrindo portas e servindo de referências para a nova geração. Que as crianças negras de hoje em dia cresçam não só se enxergando, mas sabendo que podem alcançar qualquer lugar que desejarem, que a nossa geração está fazendo o possível para que, até lá, não seja mais um caminho tão difícil assim.
É árduo, mas tem dores que valem suas recompensas. Combater o racismo é uma dessas e cada um faz como pode. O meu jeito é este aqui, espero que valha.
Até a semana que vem!
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