
(Foto: Reprodução/IMDB)
Ao mesmo tempo que o cinema possui um objetivo próprio, descrito através de seus planos e roteiros, não há como negar que também se trata de uma arte carregada de subjetividade. Afinal de contas, quando os créditos sobem, cada um forma sua opinião acerca do que foi visto a partir das próprias experiências, vidas, bagagens e afins. Por isso que, mesmo consumindo uma série de conteúdos sobre o filme “A Baleia”, eu sabia que somente depois de assisti-lo eu poderia bater o martelo sobre ele ser bom ou ruim.
“A Baleia” é um filme desconfortável e, por vezes, claustrofóbico. Ele oscila entre o desejo de despertar alguma empatia do público com o seu protagonista, ao passo que não mascara as coisas que ele fez em seu passado, como todo ser humano passível de erro. Apesar disso, ainda que seu julgamento chegue até Charlie, ele é um protagonista carregado de otimismo - que às vezes beira ao sádico. Ele tem fé na bondade das pessoas e enquanto esse é seu maior trunfo, também corre risco de ser sua perdição.
Durante as quase duas horas do longa, acompanhamos a última semana de vida de Charlie. Ele é um homem de 270 quilos, que vive um quadro de depressão e compulsão alimentar desde que perdeu o amor de sua vida. Homossexual, ele abandonou a então esposa e a filha Ellie, de oito anos na época, para viver um romance com Alan – o que desperta em Ellie uma raiva e mágoa que perseguem a relação de dela com o pai mesmo já tendo seus 17 anos. Por estar morrendo, ele decide tentar se conectar ou pelo menos conhecer melhor a própria filha, que se mostra uma adolescente rebelde e cruel, nas palavras da própria mãe.
Charlie é vivido por Brendan Fraser, conhecido por interpretar papéis em A Múmia e em George o Rei da Floresta. O ator passou por um longo período de ostracismo em Hollywood depois de denunciar o assédio sexual que sofreu por Phillip Brek, ex-presidente da organizadora do Globo de Ouro. “A Baleia”, portanto, marca o seu retorno aos cinemas e sua volta por cima. Do outro lado, temos em cena com ele: Sadie Sink (Stranger Things), no papel de Ellie, e Hong Chau (The Menu), vivendo a amiga e enfermeira Liz.
“The Whale” é um filme dramático, forte e que, ao contrário do seu personagem, não tenta ser otimista. Ele põe em jogo a realidade de que aquele homem vai morrer - e o quanto isso também se trata de algo condicionado ao seu processo depressivo, pois ao longo da história descobrimos que Charlie tinha dinheiro para fazer acompanhamento médico, ter um plano de saúde e mais qualidade de vida, mas ele decide não ter. Não há romantização da obesidade ao mesmo tempo em que não acredito que se trate de uma obra gordofóbica - porém, reconheço que esse é só mais um ponto de vista.
A obra discute temas importantes que vão desde as relações familiares, como os problemas de pai e filha, até questões relacionadas à opressão e homofobia presente na igreja e em determinadas religiões. E, enquanto corria risco de ser superficial em tudo que tentava falar, ao meu ver “The Whale” consegue usar Charlie de elo, entrelaçando os assuntos com a vida desse protagonista, deixando que eles sejam superficiais no debate mais amplo, mas profundos quando se trata das camadas e da narrativa do personagem.
Até a escolha de seu nome, que era algo que me perturbava desde que fora divulgado, “The Whale” consegue explicar o porquê. O que parecia ser algo irônico ou controverso - e que não precisa deixar de ser -, é um reflexo do que esse pai tinha em comum com a própria filha: a escrita. Fazendo uma alusão a um texto de Moby Dick que aparece na trama.
Por fim, é válido dizer que este poderia ser um filme esquecível, caso o ator fosse outro. Brendan Fraser se entrega ao personagem de um jeito único e que torna uma história “simples” em algo grandioso. Não temos um roteiro inovador ou revolucionário, então o mérito fica todo para a atuação - e quando Fraser divide cena com Chau ou Sink, o que tava bom fica ainda melhor.
“A Baleia” não é diferente do que eu imaginava. Cru, forte, sensível e doloroso. Desperta em você inúmeros sentimentos que vão da raiva e do nojo à empatia, com alguns sorrisos no meio do caminho. É um filme sobre uma realidade que eu nunca vivenciei, mas que consegue ainda assim passar a sua mensagem. Além de discutir perdão e autoperdão, a trama pra mim chega como algo que fala sobre fazer alguma coisa. Fazer a diferença. E não digo com algo grandioso, mas ter certeza de que o mínimo que você pode dar ainda é alguma coisa em alguma circunstância.
Charlie ressalta que Ellie é a melhor coisa que ele já fez, mas ele também encorajou uma série de alunos, ele também amou e foi amado. Liz parece não conseguir mais fazer a diferença, mas ela demonstrou força, empatia e cuidado para com o outro - e ela era a única pessoa que entendia a dimensão da sua dor. A própria Ellie, que soa tão cruel, por vontade de ajudar - ou machucar - faz algo de bom para alguém. Sutilmente, o filme destaca a importância da ação e como cada um pode encontrar, no que quer que seja, a sua vontade de ficar de pé.
Respeito quem não tenha se conectado de algum modo com o filme, mas, genuinamente, não consigo entender. Por outro lado, que bom que não foi o meu caso. Saio desse filme mais reflexiva, atenta e ainda mais encantada com a força e a vontade de ficar de pé de Fraser. Que a Academia possa reconhecê-lo, porque não tem ninguém que mereça mais o Oscar de Melhor Ator esse ano do que ele.
Nota: 10/10
“A Baleia” é um filme desconfortável e, por vezes, claustrofóbico. Ele oscila entre o desejo de despertar alguma empatia do público com o seu protagonista, ao passo que não mascara as coisas que ele fez em seu passado, como todo ser humano passível de erro. Apesar disso, ainda que seu julgamento chegue até Charlie, ele é um protagonista carregado de otimismo - que às vezes beira ao sádico. Ele tem fé na bondade das pessoas e enquanto esse é seu maior trunfo, também corre risco de ser sua perdição.
Durante as quase duas horas do longa, acompanhamos a última semana de vida de Charlie. Ele é um homem de 270 quilos, que vive um quadro de depressão e compulsão alimentar desde que perdeu o amor de sua vida. Homossexual, ele abandonou a então esposa e a filha Ellie, de oito anos na época, para viver um romance com Alan – o que desperta em Ellie uma raiva e mágoa que perseguem a relação de dela com o pai mesmo já tendo seus 17 anos. Por estar morrendo, ele decide tentar se conectar ou pelo menos conhecer melhor a própria filha, que se mostra uma adolescente rebelde e cruel, nas palavras da própria mãe.
Charlie é vivido por Brendan Fraser, conhecido por interpretar papéis em A Múmia e em George o Rei da Floresta. O ator passou por um longo período de ostracismo em Hollywood depois de denunciar o assédio sexual que sofreu por Phillip Brek, ex-presidente da organizadora do Globo de Ouro. “A Baleia”, portanto, marca o seu retorno aos cinemas e sua volta por cima. Do outro lado, temos em cena com ele: Sadie Sink (Stranger Things), no papel de Ellie, e Hong Chau (The Menu), vivendo a amiga e enfermeira Liz.
“The Whale” é um filme dramático, forte e que, ao contrário do seu personagem, não tenta ser otimista. Ele põe em jogo a realidade de que aquele homem vai morrer - e o quanto isso também se trata de algo condicionado ao seu processo depressivo, pois ao longo da história descobrimos que Charlie tinha dinheiro para fazer acompanhamento médico, ter um plano de saúde e mais qualidade de vida, mas ele decide não ter. Não há romantização da obesidade ao mesmo tempo em que não acredito que se trate de uma obra gordofóbica - porém, reconheço que esse é só mais um ponto de vista.
A obra discute temas importantes que vão desde as relações familiares, como os problemas de pai e filha, até questões relacionadas à opressão e homofobia presente na igreja e em determinadas religiões. E, enquanto corria risco de ser superficial em tudo que tentava falar, ao meu ver “The Whale” consegue usar Charlie de elo, entrelaçando os assuntos com a vida desse protagonista, deixando que eles sejam superficiais no debate mais amplo, mas profundos quando se trata das camadas e da narrativa do personagem.
Até a escolha de seu nome, que era algo que me perturbava desde que fora divulgado, “The Whale” consegue explicar o porquê. O que parecia ser algo irônico ou controverso - e que não precisa deixar de ser -, é um reflexo do que esse pai tinha em comum com a própria filha: a escrita. Fazendo uma alusão a um texto de Moby Dick que aparece na trama.
Por fim, é válido dizer que este poderia ser um filme esquecível, caso o ator fosse outro. Brendan Fraser se entrega ao personagem de um jeito único e que torna uma história “simples” em algo grandioso. Não temos um roteiro inovador ou revolucionário, então o mérito fica todo para a atuação - e quando Fraser divide cena com Chau ou Sink, o que tava bom fica ainda melhor.
“A Baleia” não é diferente do que eu imaginava. Cru, forte, sensível e doloroso. Desperta em você inúmeros sentimentos que vão da raiva e do nojo à empatia, com alguns sorrisos no meio do caminho. É um filme sobre uma realidade que eu nunca vivenciei, mas que consegue ainda assim passar a sua mensagem. Além de discutir perdão e autoperdão, a trama pra mim chega como algo que fala sobre fazer alguma coisa. Fazer a diferença. E não digo com algo grandioso, mas ter certeza de que o mínimo que você pode dar ainda é alguma coisa em alguma circunstância.
Charlie ressalta que Ellie é a melhor coisa que ele já fez, mas ele também encorajou uma série de alunos, ele também amou e foi amado. Liz parece não conseguir mais fazer a diferença, mas ela demonstrou força, empatia e cuidado para com o outro - e ela era a única pessoa que entendia a dimensão da sua dor. A própria Ellie, que soa tão cruel, por vontade de ajudar - ou machucar - faz algo de bom para alguém. Sutilmente, o filme destaca a importância da ação e como cada um pode encontrar, no que quer que seja, a sua vontade de ficar de pé.
Respeito quem não tenha se conectado de algum modo com o filme, mas, genuinamente, não consigo entender. Por outro lado, que bom que não foi o meu caso. Saio desse filme mais reflexiva, atenta e ainda mais encantada com a força e a vontade de ficar de pé de Fraser. Que a Academia possa reconhecê-lo, porque não tem ninguém que mereça mais o Oscar de Melhor Ator esse ano do que ele.
Nota: 10/10
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