EM CARTAZ: Medusa

(Foto: Vitrine Filmes/Divulgação)

Uma das melhores sensações para quem é fã de cinema é sair da sala de projeção extasiado por ter encontrado em uma obra tudo o que você é apaixonado. Foi assim que saí do último filme da diretora Anita Rocha da Silveira, o premiado Medusa, que chegou aos cinemas recentemente. Se conectar a algo, abastecer sua psiquê ou adentrar em um universo construído totalmente com visões e versões de existências que te rodeiam, te faz imaginar algo muito maior e ficcional, onde a qualquer momento um monstro vai brotar. Contudo, em Medusa (e na vida real), os monstros tem CPF e, às vezes, moram na mesma cidade que você (ou na mesma casa).

O longa-metragem toca no mesmo local que seu debut, Mata-Me Por Favor (2015): a existência feminina, seu papel social e como ela é vista. Usando o suspense de uma trama super envolvente, a cineasta carioca faz uma crítica social de maneira clara e direta. Mesmo em meio a alegorias, ela consegue ser precisa, sem deixar o telespectador sair com dúvidas do que acabou de assistir.

Na história, nós somos apresentados a um grupo de garotas eclesiásticas, tementes a sua religião, que não aceitam que outras mulheres vivam suas vidas como bem desejem. As que fogem do ideal de “bela, recatada e do lar” logo se tornam alvo do grupo de “limpeza”. Em meio a violência e usando as redes sociais, elas forçam suas verdades. Somente quando Mariana, vivida por Mariana Oliveira, é retaliada durante um ataque que uma mudança ocorre entre elas. Em sua obsessão para encontrar Melissa (Bruna Linzmeyer), a primeira vítima de todo esse caos, ela e sua amiga Michele (Lara Tremouroux), criam um plano de se infiltrarem em um hospital.

A vida que elas tanto abominam, também em suas existências mais silenciosas, traz uma fascinação única e aos poucos elas tentam se convencer de que o que vivem é o real. A busca por Melissa aos poucos faz com que Mariana se conheça cada vez mais. Nesse propósito, o público vai entendendo mais do que tá acontecendo com as meninas e a congregação em que elas frequentam, guiada pelo Pastor Guilherme (Thiago Fragoso), que em seu principal discurso pede que o povo vá às ruas e lute contra as obscenidades que povoam a humanidade – e com isso, leve ele para um cargo em Brasília.

(Foto: Vitrine Filmes/Divulgação)

Inspirado pelo conhecido mito grego e com influências giallo do Dario Argento, o suspense de John Carpenter e a crítica social de Jordan Peele, Medusa consegue ser magistral em todos os sentidos. Suas escolhas são precisas em tomadas onde o ambiente é um elemento primordial. São várias as narrativas deliberadas para apresentar a sua ideia, que juntas trarão a grande conclusão em seu ato final. E, no fim das contas, toda essa confecção cinematográfica tem um componente que conduz todas as sensações: a sonoplastia.

Em conjunto com o maravilhoso Bernardo Uzeda, Anita embarca em uma tensão a base de sintetizadores tal qual Carpenter e Argento. Além disso, as escolhas de músicas para compor a trilha sonora casa muito bem com todos os momentos vividos pelos personagens.

No último ato, Medusa derruba toda a hipocrisia vivida pelos personagens. A violência, o machismo e as inverdades que cada mulher vive e sobrevive. O principal símbolo dessa libertação é um grito entorpecente que quando uma grita, parece que essa liberdade é dada para a seguinte e quando todas gritam, essa força é elevada a níveis nunca antes presenciado. Enquanto elas usavam máscaras para expurgar quem não concordasse com elas, objetos que dão o tom aterrorizante durante todo o filme, as máscaras sociais também escondem segredos e todo o filme é mostrado. Quando não estão a utilizá-las, o que lhes restam é gritar por salvação, por socorro, por liberdade, pelo não ou pelo sim.

(Foto: Vitrine Filmes/Divulgação)

Com um elenco competente, os destaques do filme são da protagonista Mariana Oliveira e sua coadjuvante Lara Tremouroux, que quando estão em cenas são complementares e antítese. Mesmo em seus aspectos mais fúteis, as duas entregam versatilidade em cena. Tremouroux carrega na storyline de Michele a realidade de várias garotas, cristãs ou não, e quando quebra essa parede social, apenas uma amiga pode estar ali. É onde entra Mariana, que independente do que tenha passado, não solta sua mão.

A sensação como telespectador é de constatar que o nosso cinema nacional resiste, mesmo tendo passado por um governo que negava a nossa cultura, e que consegue entregar grandes produtos. O nome de Anita Rocha da Silveira já pode ser considerado um dos melhores do cinema para se acompanhar. Com sua bagagem, ela entrega um filme que não deixa a desejar a nenhum importado.

Nota: 9/10

Ps: para os pessoenses, Medusa está em exibição no Cine Bangue, no Espaço Cultural, e vale muito a pena. Não perde tempo e vai apreciar essa, que já é uma das melhores obras nacionais.


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Adan Cavalcante
Adan Cavalcante

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