A dor e a delícia de se descobrir um fã

Já faz duas semanas que Rita nos deixou. E logo fará mais. O tempo é assim: não para de passar, danadinho. Quando soube, fiquei mal (mesmo). É que, assim como Bea, eu não conhecia um mundo sem Rita Lee. Dias depois, soube que, após o anúncio de sua morte, “Rita Lee” foi o termo mais procurado do YouTube por um tempo. Acho que o mundo também já não se lembrava mais de como era existir sem a existência dela. Que orgulho de ser fã de uma bruxa dessas! Espera, fã…!? Esse texto é para você (ou para mim), que depois da adolescência se descobriu fã de algo ou alguém especial.

Entre 2012 e 2017 passei por algumas várias barras. Foram cinco anos bem complicados. Imagino que a adolescência deva ser para muitos essa coisa meio inconsistente e sempre fluida, firme e forte como gelatina. Mas é que a minha adolescência, em especial, foi quando eu descobri que aquele geladinho na barriga que eu sentia antes de ir ao Hopi Hari também poderia ser um geladão na alma… Foi durante esses cinco anos que eu desenvolvi ansiedade e aprendi que se eu não fosse mais gelada que a minha alma (ou a minha barriga), não chegaria aos 23 para contar essa história. Pois é, bullying é sempre algo complicado de traduzir, mas é assim que eu gosto de contar.

Enfim, em 2011 meus pais conseguiram financiar uma casa por um programa do Governo Federal e a gente se mudou da cidade onde eu sempre vivi. Até então, eu não conhecia outro mundo além daquele onde estive nos 11 anos anteriores. E foi depois dessa mudança - e de tudo que aconteceu - que eu descobri que existia muito mundo por aí. Mas isso fica para outro texto.

Nessa época, quando nos mudamos, eu conheci uma vizinha que me apresentou a One Direction. E eu não sabia que precisava, queria ou gostava de ser fã até sê-lo. Que coisa boa é gostar de quem a gente acredita que gosta da gente, mesmo que esse alguém more na Inglaterra e não faça ideia que você existe. Fazer o quê? Faz parte. Ser fã é assim mesmo, uma delícia.

Com exceção do Ashton Kutcher (que foi meu primeiro crush :P), Harry, Liam, Louis, Niall e Zayn me ensinaram o que é paixão platônica. Com eles mergulhei fundo no universo das fanfics e aprendi a não ter vergonha de gostar das coisas. Descobri, ao longo dos anos que vivi pela One Direction, que a dor de ser fã também existia. Lembro como se fosse ontem do dia que circularam nas redes sociais umas fotos deles em uma lancha, fumando maconha. Eu jurava que eles iam morrer por isso. Ora, ora, pensando bem, como o mundo é irônico, não? Hoje, estamos nós seis vivinhos.

Tive posters, revistas, cadernos, camisetas, CDs, tudo o que conseguia comprar com meu rico dinheirinho de neta que ganhava R$ 5 contrabandeados na surdina pela avó (saudade, 1D, saudade, vovó). Atenção: não era tudo o que o mercado tinha disponível; era tudo o que eu conseguia comprar. E, para mim, estava bom!

Pelo menos eu achava que estava bom até anunciarem a vinda para o Brasil, porque, naquele dia, eu descobri que não estava nada bom. Como é que uma lisa como eu iria para um show, sozinha, em São Paulo, sem um tostão no bolso? Mas aí a vizinha-anjo surgiu, do alto de sua nuvem esplendorosa e anunciou que iríamos juntas para a capital, bastava que eu comprasse o ingresso. E começou o chororô… E minha irmã (que, a título de curiosidade, é 12 anos mais velha e, obviamente, já era adulta nessa época) disse que pagaria. E recomeçou o sonho. Agora, eu estava junto com minha vizinha naquela nuvem esplendorosa, circulando pelos ares, imaginando o lindo momento em que cantaríamos juntas todas as músicas que ensaiávamos todos os dias na rua.

Até que a vizinha vem no meu portão avisar que não vai rolar mais. O avô dela não ia poder nos levar e sei lá o que mais. Caímos da nuvem, mas tudo bem, estávamos juntas nessa. Estávamos, no passado, porque eu entrei um dia no Facebook e vi aquela vaca no show e eu em casa. Nunca mais olhei na cara dela, mas, depois de me jogar da nuvem, a descarada ainda teve coragem de ir em casa dizer que estava com saudades. Vaca mentirosa.

Na real eu não sei o que rolou de verdade na época. Suspeito que os pais dela tenham achado responsabilidade demais deixar eu ir junto, mas não precisava ter mentido, precisava? Agora eu sou uma pessoa rancorosa, com dificuldade em acreditar nas minhas amizades por causa disso. Olha aí o tamanho do estrago. Não se brinca com uma fã.

Por falar em fã, a One Direction, assim como minha amizade com a sem-vergonha da vizinha, não durou muito tempo. Primeiro saiu um, depois o negócio que já estava morno, terminou de esfriar. E a tão temida pausa por tempo indefinido veio aí. O resto vocês já sabem.

O fato é que, de lá para cá, resolvi que fiquei viúva e nunca mais embarquei em nenhuma pira de gostar (a fundo) de nada. Tenho até me achado bem careta, envelhecida e sem graça, confesso. Mas é que ser fã dá trabalho.

Então Rita Lee morreu. E, bem dramática, chorei no banho (e fora dele também!). Chorei baixinho, um choro quente, triste e sofrido. Um chorinho que eu conheço bem. Um chorinho que não chorava há bastante tempo. O choro de fã. Como posso ter eu, no entanto, chorado um choro de fã se não sou fã de Rita Lee? Sempre me intitulei como “alguém que gosta muito, muito dela”, nunca como uma fã. E, depois de chorar e tanto indagar sobre a natureza daquele choro, percebi que ser fã (sobretudo depois da adolescência fanática) nada mais é que gostar muito, muito de alguém.

E, na dor, descobri a delícia de ser fã (e, de novo, viúva) de Rita Lee. Obrigada por mais essa, Ritinha!
Carol Cassoli
Carol Cassoli

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